sexta-feira, 28 de julho de 2017

Fragmentário

Metade de mim
é tudo o que lembro
quando absorto
dentro da noite escura.
A outra metade
é tudo o que esqueci
fronte ao mar.

(Mergulho e acordo  na noite estrelada dos céus de Gogh)

Há calmaria revolta,
solidão e pranto
das águas que se agitam
na arrebentação do cais em mim.

Esvaem-se meus pensamentos
num mergulho a fio
pelas nebulosas da abóbada.
Jorram ressacadas sobre os madrigais
perpétuas estátuas de sal
a salgar o pranto  em mosaicos
no calçadão de Copacabana.

domingo, 23 de julho de 2017

Morbidez

Metade de mim é
antropofagia mórbida
De uma rosa adormecida
no espelho de minha consciência.

A outra metade é saturação
entre o eu e o mim
Ponte que liga
realidade e fantasia;

O que sou eu
quando não uma guerra
entre o hipônimo e o hiperônimo?
Quem sou eu
caso não um elo
do adjetivo com o substantivo?

Nesta valsa
que liga as orações
sou capacho.
Na contradança
desta toada sem sentido
Monsenhor, sou vassalo.

quinta-feira, 20 de julho de 2017

Segregário

Flor
sobre o abismo.
Gente
gritando socorro.
Dor
na pátria civil.
Morte
nas favelas e guetos.
Construção
de gente faminta.
Justiça
implorando água.
Instrução
aos porcos.

Do céu da pátria chove
um pranto abundantemente
vermelho];
Seu Zé no alto do morro
chora
O sangue preto
do filho nos braços.

Miséria. Miséria.
Miséria no chão da pátria.
A fome assola minha gente,
Bocas cheias de dentes
riem ao sol
Riem o sal dos olhos
diante do fantasma da pobreza.

- Onde vais operário?
Teu suor já salgou por demais a terra
Não te demores por onde fores
O vosso enterro é logo já.

quarta-feira, 12 de julho de 2017

Versos de finados

"De nós restaram somente as lembranças, junto à elas as cinzas mortas de um cigarro e aquela marca de batom que deixastes estampada na velha taça que agora de dissolve."

Embriaguez I

Um rio desaguou-se na vida
a vida sobre o mar.
Tudo é imensidão, é infinito,
é loucura ardente

A vida, o mar,
a coroa sobre a fronde
sobre os seios
de uma vida a pulsar

O amor é o delírio dos loucos
A vaidade dos narcisos
A masturbação dos libertinos
e a máscara dos caretas.

Amor. Amar-te.
Amei-te na bituca de um cigarro
que agora assassino em um copo
de uísque]

Da Música

Música,
Rogo-te música,
Declama-me música.
Grito por música.

Toda musicalidade existente no mundo
Sobre a vida,
sobre o amor,
sobre o mar,
Sobre nós.

quarta-feira, 5 de julho de 2017

O Pecado Original e a Expulsão do Paraíso, de Michelangelo (1508-1512).


Artista: Michelangelo Buonarroti (1475-1564).

Período Artístico: Renascentista.

Estética: Valorização da arte Greco-Romana (Perfeição estética nas pinturas, retomada aos conhecimentos científicos).

Identificação: Teto da Capela Sistina.

Características na pintura: Embora sejam estilos artísticos do séc. XX. É possível identificar com clareza a técnica Realista e Impressionista na imagem.

O Pecado Original e a Expulsão do Paraíso, Michelangelo


ANÁLISE PESSOAL: No livro do Gênesis capítulo 3, o escritor narra a "Tentação de Eva e a queda do homem". Para compreensão de alguns detalhes será necessário ler a introdução prévia desta postagem, onde falo sobre Lilith.

Análise para compreensão da gravura "O Pecado Original e a Expulsão do Paraíso"

Bora lá!

Ao lado esquerdo da imagem podemos visualizar Adão e Eva gozando de sua plena juventude, aparentemente exploravam a beleza de seus corpos, quando têm a atenção dispersa pela figura mitológica sobre a árvore.

É preciso observar com atenção a forma simétrica com que ambos fixam a serpente, um detalhe curioso é que a figura da serpente é metade réptil e metade mulher, essa mulher simbolicamente representa Lilith, supostamente a primeira esposa de Adão.

Michelangelo constrói corpos divinos para suas personagens, uma das características  em voga naquele período artístico (literário, filosófico, político e cultural).

A direita, após descumprirem a ordenança celestial de não comerem do fruto sagrado, o jovem Adão e a jovem Eva sofrem um envelhecimento súbito  ao serem tocados por um ser celestial nas vértebras cervicais.

Pecado, do grego, Hermatita,  também significa Erro. É presente a noção de que o pecado nos envelhece de acordo com mitologia judaico-cristã. Os primeiros homens da linhagem de Adão viviam até novecentos e tantos anos, Gênesis capítulo 5. Com a noção de transgressão sua estimativa de vida foi decrescendo até chagar a idade de cento e vinte anos, capítulo 6.

É importante observar,  sobre tudo, que Michelangelo tinha o real intuito de mesclar junto as  pinturas os seus conhecimentos científicos em anatomia. Por exemplo, o Tronco junto ao dorso de Eva, a serpente sobre a árvore, e o toque do ser celeste na coluna cervical de Adão.



Tronco junto ao dorso de Eva: Representação do arco aórtico com as coronárias emergindo da base (pequenas raízes), o tronco braquicefálico à direita, artéria carótida comum, artéria carótida interna e externa.

a) arco aórtico; b) veia jugular; c) artéria carótida com sua bifurcação; d) nervo hipoglosso emergindo junto à veia jugular e cruzando a artéria carótida externa.

Árvore principal: Não possui uma linha de continuidade com o galho em que Adão apóia as mãos. Tem-se a impressão de que esse galho está emergindo da parte posterior do tronco, mas, se isso ocorresse, porque estaria projetado para o lado esquerdo, como foi retratado, e não para o plano ao fundo? Nota-se também o braço direito da figura da serpente, apoiado junto a porção superior do tronco, e o braço esquerdo que cruza o galho da árvore no plano anterior.

Afim de saber mais questões Anatômicas na obra de Michelangelo? Segue o link do blogger da Dra. Renata Calheiros Viana.


Arte médica

domingo, 2 de julho de 2017

Infância

Vai menino,
Corre pelo mundo 
como que atrás da bola
Empine sua pipa
sobre o farfalhar violento do vento
Enquanto as biroscas de gude
rompem o triangulo.

Ele roda, 
o meu guri roda
Como quem solto pelas cordas
de um  pião.
Vai meu guri, vai inerte pela ladeira
Como quem acabara de tocar
a campainha da vizinha
e se escondera para vê-la vociferar.

Ei, menino!
Saia do quintal do Manoel,
Deixe os pés de cana no lugar!
- E uma bola de canhão
feita de mamona atinge o narrador
do andar de cima.

Esconde-esconde, rouba bandeira,
entra o menino na ciranda cirandinha
e tropeça no suco gelado da corda,
vejam como seu cabelo ficou arrepiado!

Como ele pula na amarelinha,
e vence sempre no jogo de cards 
Esse é o meu menino
Esguio, miúdo de dar dó,
sorrateiro e valente. 

Corre, corre meu guri
que o teu amor de vidro  se quebrou
Um novo rebento há de nascer
Em teu berno que estourou.








O segredo de Jorge

Já caía o alvorecer quando ele chegou e eu ainda não estava pronta.

Disse a ele que se sentasse no sofá enquanto iria tomar um banho e me arrumar. Subi e rapidamente tomei um banho, escovei os cabelos, fiz todo o processo de higiene feminina e em uma hora e meia estava pronta.

Ao chegar na sala não o avistei. Percorri os demais cômodos da casa a sua procura e nada. Então resolvi olhar pela janela e avistei-o em frente ao carro, fumando. Aliviei-me, a essas horas mil e uma coisas já haviam atordoado-me os sentidos.

Já acomodada no carro de Jorge, percebi que ele estava atônito e  disperso. Era de seu costume reclamar de minha demora, e eu sabia o quanto ele odiava meus atrasos quando o assunto era compromissos agendados previamente. Porém, mesmo assim resolvi ficar calada, o que é deveras difícil. 

Durante toda a viagem Jorge permaneceu calado e eu também. Chegamos ao restaurante e fomos guiados pelo garçom à nossa mesa no piso superior. E nenhuma palavra. Comecei a ficar preocupada e nervosa ao mesmo tempo. Tive vontade de gritar e perguntar o que estava acontecendo, nunca o vira daquela maneira.

Indiscretamente, comecei a olhar para o rapaz elegante desacompanhado ao lado, a fim de ser notada pelo meu parceiro e nada. Ele não estava ali! Em determinado ponto, levantei-me da mesa e dirigi-me ao banheiro. Lá, chorei copiosamente, passado alguns minutos, creio que dez, regressei a nossa mesa que para minha surpresa estava vazia.

Tentando me equilibrar em cima do sapato, fui caminhando lentamente até a mesa. Lá havia um pequeno bilhete que dizia:  "Me perdoe, tive que sair às pressas por motivos emergenciais. Espero que não note minha falta. De quem te ama. Jorge".

Meu Deus?! Não! Não comigo! Solicitei ao garçom que me providenciasse uma água com açúcar. E após alguns minutos de choro silencioso levantei-me desnorteada a espera de pedir um táxi e sumir. Era tudo o que mais queria.

Tive imensa dificuldade para descer as escadas, a ala inferior estava completamente escura e ao breu. Mas não me importei, naquele momento estava aérea demais para me importar com a iluminação do ambiente.

Chegando no piso térreo tentei tatear alguma cadeira, a fim de me locomover até a saída. Quando olhei para a bolsa para pegar o celular, notei um vulto  passar pela imensa sala e meu coração gelou. Instantaneamente me encolhi como um bicho acoado, quando de repente o alguém começou a dedilhar o piano. Era uma música muito bonita, a qual me era desconhecida. E notei que havia mais de um vulto.

A luz se acendeu tenuemente e meu Deus! Não pudia crer naquilo que meus olhos me mostravam.
Jorge estava ajoelhado no meio do salão e segurava uma taça de espumante na mão direita. Como pude ser tão estúpida! Era claro. Era isso!  Ele me pediria em noivado naquela noite.

Das sombras emergiam os vultos dos parentes e amigos com taças de espumante nas mãos. Reconheci no piano o rapaz da mesa ao  lado. E  aquela noite a agonia tornou-se em emoção, e pude ser inteiramente feliz ao lado das pessoas que amava.

sábado, 1 de julho de 2017

Análise para compreensão da gravura "O Pecado Original e a Expulsão do Paraíso"

Introdução de análise à pintura "A queda do homem", de Michelangelo.

O objetivo aqui é a construção de uma resenha de entendimento objetivo para visualização da imagem e análise posteriormente postada.

Segundo as histórias mais antigas a primeira mulher a ser criada por Deus fora Lilith: "E criou Deus o homem a sua imagem e semelhança; a imagem de Deus os criou; MACHO e FÊMEA os criou"(Gn: 1:27). Ambos haviam sido criados da mesma matéria, o barro, porém de imediato surgiriam as primeiras confusões, pois Lilith não aceitava  submeter-se a Adão, muito menos a deitar-se por baixo dele, então ela o abandonou.

No segundo episódio vem a criação de Eva. "E disse o senhor Deus: Não é bom que o homem esteja só: far-lhe-ei uma adjutora que esteja como adiante dele" (Gn: 2:18). Já que a primeira mulher fugira de Adão,  Deus  passa para o segundo plano: A criação de um ser mais frágil e submisso. "Essa se chamará varoa, porquanto do varão foi tomada" (Gn: 2:23).

No versículo 24, após a criação de Eva, Adão começa a falar sobre o matrimônio "Porquanto deixará o varão o seu pai e sua mãe e apegar-se-á a sua mulher..." e no verso seguinte o autor diz que ambos estavam nus e não se envergonhavam. Ou seja, deixa a entender que famílias já haviam sido constituídas, uma vez que este não tinha pai e nem mãe. Também é válido observar que a escrita  não possuí um espaço cronológico da contagem do tempo.

"E da costela que o Senhor Deus tomou do homem, formou uma mulher: e trouxe-a a Adão. E disse Adão: Esta é agora osso dos meus ossos, e carne da minha carne (...)" (Gn: 2:22-23). Note a expressão usada: "Essa é agora osso dos meus ossos", enquanto a primeira era feita da terra e possuía uma equidade em relação a Adão a segunda era feita de suas próprias entranhas. Neste caso Adão era a matéria prima e Eva o produto.

No capítulo 3 do Gênesis temos a expulsão do Homem do jardim do Éden, a figura da serpente é totalmente alegórica, o autor da epopeia, Moisés, usa de linguagem literária para comparar a astúcia de Lilith com a astúcia da serpente.  Lilith seria quem teria oferecido a Eva o fruto da árvore do conhecimento e esta ao seu adjutor.

Lilith foi a primeira figura a estourar a bolha do conhecimento pela inconformidade, e note, uma figura feminina. Ela tornou-se um ser divino em diversas religiões mesopotâmicas e ao mesmo tempo comparada com a figura de Satanás por ter levado o Homem à ruína.

As histórias bíblicas são meramente ilustrativas, são epopeias que narram o surgimento de uma civilização. A escrita do Gênesis tem como base a adaptação de lendas Babilônicas e Egípcias.